Era uma solarenga tarde de Primavera, mas que levantava o véu sobre um verão arrasador.
Várias centenas de pessoas de todas as idades conversavam animadas rodeadas pelo som das palavras de ordem declamadas ao microfone.
Sob as sombras das floridas árvores, os manifestantes agrupavam-se junto das suas faixas coloridas, com frases reivindicativas que acalentavam o seu coração e alma. Nas mãos os cravos... verdadeiros ou em papel, mas com a mesma cor e vida de outrora.
Passava já das 15horas quando, alinhados em harmonia e alegria, avançaram pela cidade, sorrindo e cantando:
"25 de Abril Sempre, Facismo Nunca Mais".
À medida que seguiam, com os passos firmados na memória de um passado que lhes permitiu fazé-lo, sorriam e entregavam folhetos que, nas suas linhas impressas e fotocopiadas, encerravam valores e propostas de futuro.
Para aquelas centenas de pessoas com alma reivindicativa, com alma de mudança, Abril de 74 não era esquecimento nem conforto do presente, mas sim a energia para mudar, para exigir, para querer mais e melhor justiça, igualdade e liberdade.
Para aquelas centenas de pessoas com alma de luta, Abril era o exemplo, o caminho, a força que lhes tirou as mordaças e lhes libertou o pensamento e a vontade. Abril é passado, mas passado de exemplo, passado de lembrança e não esquecimento, passado de poder, mas poder do povo.
Abril é palavra, é cravos, é vermelho sem sangue, é calma reivindicativa, é voz do povo e voz da alma. Abril é o passado que gerou muito do presente, mas não a desculpa para baixarmos os braços, para calar a voz e para nos relegarmos ao conforto das nossas casas e deixar as ruas aos carros.
Recordemos Abril. Recordemos os direitos alcançados e recordemos tudo o que ainda falta alcançar. Abril libertou a nossa voz, mas agora gritamos por mais do que aquilo que desejavamos há 32 anos.
Estacione o carro e percorra as ruas, manifeste-se nas praças, berre frente aos edifícios... Lute pacífica mas persistentemente pelo que pensa, pelo que considera justo e certo. Não hesite em transmitir a sua opinião e iluminar a realidade tantas vezes injusta ou ignóbil deste Portugal que é nosso.
Não silencie a voz que Abril libertou...